Eu sinto falta de me surpreender. As pessoas andam muito iguais e passivas. Eu aprendi a não criar expectativas em relação a ninguém (depois de muita tentativa e erro). E mesmo que eu ainda quisesse esperar algo de alguém, seria inevitavelmente frustrada pelo óbvio: o mundo carece de emoção e de pessoas capazes de provocá-las. Essas são raridades!
Você já deve ter ouvido dizer por aí que as pessoas andam tão carentes que se alguém for educado com elas já é motivo para se apaixonarem. Acredito que seja justamente pela falta de surpresas a que me refiro. Eu falo de coisas simples mesmo. Um bom dia sorridente a um passante. Um bom atendimento ao cliente. Um agrado à pessoa amada, algo como um bilhetinho de amor ou uma rosa deixada sobre a mesa. Algo gentil. Uma delicadeza. Um elogio sincero e sem segundas intenções.
Acho tudo tão previsível. Às vezes até beiro ao pessimismo mesmo. Mas o que posso fazer? É fato! Se há um lugar onde as pessoas se comportam diferentes, por favor, diga-me onde é. Preciso urgentemente de ir para lá. Um lugar sem joguinhos de interesse. Onde a vendedora não vai dizer que aquela calça de oncinha dois números menor que o manequim da cliente ficou simplesmente maravilhosa nela só porque ela precisa atingir a meta do mês custe o que custar. Um lugar onde as pessoas não vão deixar de ser suas “amigas” só porque você não tem nada a oferecer-lhes além de sua atenção. Um lugar onde os produtos anunciados sejam exatamente como anunciados e com preços justos para que todos saiam ganhando. Um lugar onde as pessoas realmente se importam umas com as outras e por isso fazem sempre o melhor que podem.
Parece tão fácil ser gentil. O que está acontecendo com o mundo? Cadê todo mundo? Onde foram parar os bons? Por quê essa inércia afetiva? Por que essa má vontade generalizada? Eu fico triste com essa discrepância. Todo mundo quer receber, mas ninguém está disposto a dar. Estão todos vivendo sob a luz do ditado popular: “a farinha é pouca, meu pirão primeiro”. Onde vamos parar agindo assim? Isso me lembra uma história oriental mais ou menos assim:
Um discípulo pergunta ao mestre sobre o paraíso e o inferno. O mestre o leva a um grupo de pessoas que estão presas em volta de um lago no qual, ao centro, há uma ilhota com uma bacia de arroz. Cada pessoa tem em mãos um longo par de palitos (rachis). Longos o suficiente para alcançar o arroz na bacia, porém longos demais para levá-lo à própria boca. Passado um tempo, todas morrem de fome e de exaustão pelas tentativas infrutíferas de comer o arroz. O mestre diz ao discípulo: “Isso é o inferno!”
Seguindo com seu discípulo para outro grupo em situação semelhante, o discípulo pode notar que as pessoas estão felizes e bem alimentadas. Elas descobriram uma forma de não morrerem de fome: os palitos eram longos demais para levar à própria boca, mas o suficiente para alimentar uns aos outros. O mestre conclui: “Isso é o paraíso!”
Gosto muito dessa história. E, infelizmente, vejo que estamos ainda vivendo no primeiro grupo. Torço muito para que possamos aprender a viver como as pessoas do segundo.